Por uma opção da família, passei, junto com pais, irmãos e sobrinhos, nove dias em um desses hotéis all inclusive, na Bahia, para celebrar os 80 anos de meu pai e os 55 anos de casados dos velhos. Fazia muito tempo que a família toda não se reunia para algo do tipo e o saldo final foi extremamente generoso para todos: uma dose enorme de carinho, de afeto, de risadas e de trocas.
Para quem não sabe, um hotel all inclusive é aquele que inclui, em seus preços, todas as refeições e bebidas, inclusive alcoólicas, durante 24 horas, oferecendo ainda uma ampla variedade de atividades, esportes e diversões, também incluídas no preço. A primeira vez que ouvi falar nesse tipo de acomodação foi nos resorts do Caribe, mas a moda parece que pegou forte nos grandes hotéis do Nordeste do Brasil. E era uma dessas coisas que eu dizia que “nunca experimentei e nunca gostei”.
Por uma opção pessoal, fui o único da família que optou pela acomodação não inclusive, o que implicou eu pagar pelas despesas de alimentação e bebidas durante minha estadia. No entanto, meus bons propósitos não resistiram à lógica de um hotel all inclusive, porque a única forma de eu escapar dos grandes buffets de comida servidos durante as refeições era pedir à la carte no quarto, longe do resto da turma, o que não fazia muito sentido. Assim, me sobrava a opção de pagar o elevado preço do buffet para comer apenas alguma coisinha mais leve, como era a minha vontade, ou cair na tentação de experimentar um pouquinho da grande variedade de comidas e bebidas apresentadas, sem falar na variada mesa de doces, meu ponto fraco. Ou seja, todo o conceito de all inclusive é formulado para você comer, comer muito. O tempo todo… a toda hora…
Esses hotéis são normalmente construídos distantes dos grandes centros, geralmente em praias remotas. Mas isso não faz muita diferença, pois a maior parte das pessoas não sai de dentro do hotel, nem mesmo para ir à praia (seja por que na praia as comidas e bebidas não estão incluídas ou, se incluídas, demoram mais pra chegar). Mas para que ir a algum lugar? Afinal, comer e beber por 24 horas seguidas te tira o peso de ter que fazer planos para algum outro tipo de atividade. Deve ser por isso que os resorts recomendam que você descanse bem antes da viagem. Eu acreditava que era para aproveitar tudo o que o resort tem a oferecer, mas na verdade é para que o tempo de comer e de encher a cara não seja desnecessariamente reduzido pela necessidade de sono.
Os hóspedes são ‘marcados’ com uma pulseirinha colorida não-removível, que o qualifica a pedir de tudo a qualquer hora. Não é difícil perceber um certo orgulho nos seres que a exibem, como que dotados de um poder maior que os dos pobres mortais que têm que pagar pelo que comem e bebem, como eu, igualmente marcado por uma pulseirinha de outra cor que denota a minha inferioridade. Essa pulseirinha poderosa habilita os seres que a vestem a comer e beber bastante entre as refeições e, depois, nas refeições, comer e beber ainda mais. Não é muito provável que estejam fazendo isso por fome ou por necessidade e confesso não conseguir enxergar muito o sentido de toda essa comilança.
Imagino que, ao contrário de acomodações mais tradicionais, um resort all inclusive não ajuda muito a economia local, a não ser os donos do próprio hotel. Afinal, além de todos os estímulos para ficar dentro do hotel, não há muitos estímulos para sair dele. Esses hotéis estão normalmente muito distantes de tudo e de todos, fazendo com que sair do hotel para conhecer alguma outra coisa seja uma empreitada tão onerosa ou complexa que a opção é mesmo continuar comendo e bebendo em local conhecido, sem precisar pagar adicionalmente por serviços que já foram pagos e incluídos na sua hospedagem, nem se deslocar para nenhum outro lugar mais distante do que a piscina do hotel. Era exatamente isso que acontecia no nosso hotel, onde a maior parte dos hóspedes sequer se dirigia à praia em frente (50 metros), concentrando-se na área ao redor da piscina do hotel.
Ao longo dessa semana, consegui fugir do presídio, digo, do resort, por pelo menos três vezes, para conhecer um pouco da cidade e de outras praias, bem como para experimentar um pouco da gastronomia local (sim, porque se a comida do resort não pode ser descrita como ruim, certamente preza mais a quantidade do que a qualidade, numa terra onde as opções gastronômicas são absolutamente maravilhosas). Nem sempre tive sucesso em convencer companheiros de fuga; afinal a fuga implica despesas que a mera permanência no presídio já elimina.
Resumindo, foi bom porque o objetivo era esse: juntarmos a família toda para uma celebração. Muito provavelmente, a convivência intensa não teria acontecido num cenário onde as opções de passeios e de refeições fossem suficientemente amplas para cada um fazer, comer e beber o que gosta na hora que gosta. Pode até ser que alguma situação bastante particular, seja pelas circunstâncias, seja pelo local, me leve novamente a um hotel all inclusive. Mas definitivamente essa não é a minha praia. Além do que, é forçoso reconhecer que, exceto por algumas pequenas variações, um hotel igualzinho a esse, localizado a 30 km de Brasília, não faria muita diferença. Ok, aqui tem o clima, tem a fantástica vista do mar da varanda onde agora escrevo, mas a considerar o que fiz por aqui, vir ou não vir à Bahia não teria feito muita diferença.
31 de janeiro de 2010
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