30 de novembro de 2005

Nairobi, Quenia - A África Errada - Novembro 2005

Agora, estou em Nairobi, no Quenia. O pior dessa viagem, alem de nao encontrar chocolate e internet, tem sido explicar para quem eu encontro por que eh que o Brasil aprovou o comercio de armas, uma coisa que soh boa para bandidos e para a elite. Mas essa eh outra discussao. A viagem tá sendo boa mesmo eh prá eu contar prá quem acha que minha vida de viajante é uma maravilha. Na minha recente fase Polyanna, eu até estava achando tudo lindo e maravilhoso, naquela de que, se tem que ser assim, que seja. E que eu tire o melhor disso. E foi mais ou menos o que aconteceu na China, que foi uma super cansativa – acho que estou cansado daquela viagem até hoje, sem nem me recuperar dos fusos horários – mas foi uma viagem interessante, com bastante trabalho mas também com a chance de conhecer algumas coisas interessantes do país.

Mas essa aqui, não há Polyanna que resista. Eu até vim animadinho, porque, apesar do longuíssimo vôo, em três trechos, o trecho mais longo (de quase 10 horas) foi o mais confortável vôo que já peguei em todas essas viagens. Poltronas ótimas, grande espaço entre assentos, boa comida, tudo tava indo bem. Até a hora em que cheguei ao hotel. Dizem que o hotel é um tal de hotel-escola da cidade, mas se for eles ainda têm muito que aprender até começar a ensinar.

Já começou no check in. Depois de tantas viagens, já percebi que vc sabe mais ou menos o que esperar de um hotel pelo que vc encontra no check in. Aqui foi um processo lento, burocrático, confuso, até que eu recebesse a chave do quarto. O quarto correspondeu às expectativas que eu comecei a ter já no check in... horrível. Um carpete fedorento, lençóis velhos, móveis antigos e em mal estado, paredes precisando de uma boa pintura, cortinas empoeiradas. Num lugar de extremos de calor, surpreende não ter um ar condicionado nem um ventilador. Frigobar com água gelada, nem pensar. E o tolinho aqui ainda perguntou na recepção se havia internet no quarto. Finalmente, no teto, um romântico mosquiteiro pendia sobre a cama, o que prometia uma noite cheia de mosquitos dados os furinhos na tela do mosquiteiro.

A vista que me tinham descrevido como a principal atraçao do hotel era desoladora. De fato, uma bela piscina numa área verde extensa e até simpática. À volta da piscina, um cenário típico desses filmes africanos, tipo Out of África, onde um bando de empregados negros, vestidos imaculadamente de brancos, deslizam entre as mesas servindo abonados cidadãos deitados sobre as espreguiçadeiras. O detalhe é que muitos dos cidadãos eram também negros, e depois vim a descobrir que o hotel era uma espécie de clube local, onde a elite abonada pode pagar mensalmente para usar as instalações. E logo na divisa do hotel, ao fundo da minha privilegiada vista, uma enorme favela, provavelmente residência de muitos dos empregados do hotel.

O banheiro, a começar pela iluminação, extremamente pobre, que só pode ser intencional para que não se perceba o tom escurecido dos azulejos. Mas isso não foi nada até o momento em que descobri, tarde demais, que a água quente só existia até 11 horas da noite. Enfim, um daqueles hotéis em que vc chega e decide que no dia seguinte vai embora. Mas no dia seguinte, na correria do trabalho, cheio de compromissos e correndo muito, vc começa a pensar que não vale a pena esse esforço todo por apenas 3 noites. Mas que acabam por serem três noites longe de serem as noites mais interessantes da minha vida.

No trabalho, o velho esquema. Passar o dia inteiro em reunioes no centro de convencoes. Até aí, nada de diferente, muito trabalho, a velha dificuldade de ficar mudando de língua o tempo todo e, confesso, até muito mais trabalho do que eu previa para essa viagem. Mas isso nem me incomoda, faz parte. O que me incomoda mesmo é encarar o absolutamente almoço buffet no único restaurante disponível. O que se tornou ainda pior considerado o igualmente intragável café da manhã no hotel, onde, imagino, os pães servidos deveriam até ter sido gostosos há uns 10 dias atrás, quando devem ter sido feitos.

Entao, essa viagem está longe de ser qualquer coisa que eu possa recomendar a alguém de quem eu goste, embora a África, em si, seja um continente fascinante em termos de vida selvagem, música, cultura, comida, artes... é apenas que, dessa vez, eu vim prá África errada.